18 May
Mecanicismo

O mecanicismo é o antecessor do fisicalismo, uma doutrina que hoje em dia está no centro de grande parte da investigação dos filósofos contemporâneos. Tanto o mecanicismo como o fisicalismo são diferentes formas de reducionismo. 

O que é o reducionsimo? É a ideia central no desenvolvimento da ciência e da filosofia, de que podemos reduzir alguns fenômenos de certo tipo a fenômenos de outro tipo. Do ponto de vista psicológico e até filósofico, o reducionismo pode ser encarado como uma vontade de diminuir drasticamente o domínio de fenômenos primitivos existentes na natureza. Hoje em dia sabemos que todos os fenômenos químicos são no fundo agregados de fenômenos físicos: os físicos são primitivos e os químicos são derivados.

O reducionismo, no entanto, é mais do que uma vontade de diminuir o domínio de fenômenos primitivos. É um aspecto da tentativa de compreender a natureza última da realidade. É um aspecto importante da tentativa de saber o que explica os fenômenos. Assim, se os fenômenos químicos são no fundo fenômenos físicos e se tivermos uma boa explicação e uma boa compreensão do que são os fenômenos físicos, então assim, igualmente, será o nosso entendimento quanto aos fenômenos químicos, desde que saibamos reduzir a química à física.

O mecanicismo foi refutado no século XIX por Maxwell, que mostrou que a radiação electromagnética e os campos electromagnéticos não tinham uma natureza mecânica. O mecanicismo é a ideia segundo a qual tudo o que acontece se pode explicar em termos de contatos físicos que produzem "empurrões" e "puxões".

Dado que o mecanicismo é uma forma de reducionismo, não é de admirar que o principal objetivo de Descartes tenha sido o de unificar as diferentes ciências como se de uma só se tratasse, de modo a constituir um saber universal. Não via mesmo qualquer motivo para que se estudassem cada uma das ciências em separado, visto que a razão em que se apoia o estudo de uma ciência é a mesma que está presente no estudo de qualquer outra.

Quanto ao método, Descartes achava também que só o rigor matemático poderia faze as ciências darem frutos. Daí que tivesse dado o nome de mathesis universalis ao seu projeto de unificação das ciências. A matemática deveria, portanto, servir todas as ciências.

Relativamente à condição de que todo o conhecimento deveria partir do mesmo princípio, só poderia ser o pensamento ou razão. Descartes queria tomar como princípio do conhecimento alguma verdade que fosse de tal forma segura, que dela não pudéssemos sequer duvidar. E a única certeza inabalável que, segundo ele, resistia a qualquer dúvida só podia ser a evidência do próprio ato de pensar.

Em relação ao fundamento do conhecimento, este deveria ser encontrado, segundo Descartes, em Deus. Deus era a única garantia da veracidade dos dados - racionais e não sensíveis - e, consequentemente, da verdade do conhecimento. Sem Deus não poderíamos ter a certeza de nada. Ele foi o responsável pelas ideias inatas que há em nós, tornando-se por isso o fundamento metafísico do conhecimento.

Temos, assim, as diversas ciências da época concebidas como os diferentes ramos de uma mesma árvore, ligados a um tronco comum e alimentados pelas mesmas raízes. As raízes de que se alimenta a ciência são, como vimos, as ideias inatas colocadas em nós por Deus. Estamos, neste caso, no domínio da metafísica.

Vale a pena salientar duas importantes diferenças em relação a Galileu. A primeira é a do papel que Descartes atribuiu à experiência. Se o método experimental de Galileu parte da observação sensível, o mesmo já não acontece com Descartes, cujo ponto de partida é o pensamento, o que acarreta uma diferença de método. Não é que, para Descartes, a experiência não tenha qualquer papel, mas este é apenas complementar em relação à razão. Reforça-se, todavia, a importância da matemática.

A segunda diferença diz respeito ao lugar da metafísica. Enquanto Galileu se demarcou claramente de qualquer pressuposto metafísico, Descartes achava que a metafísica era o fundamento de todo o conhecimento verdadeiro. Se Descartes, todavia, via em Deus o fundamento do conhecimento, não achava necessário fazer intervir a metafísica na investigação e descrição dos fenômenos naturais.