22 Mar
A biologia da empatia

Giacomo Rizzolatti, nascido em 28 de abril de 1937 é um neurofisiologista italiano que trabalha na Universidade de Parma. Nascido em Kiev, Ucrânia, ele é o Cientista Sênior da equipe de pesquisa que descobriu neurônios-espelho no córtex frontal e escreveu muitos artigos científicos sobre o assunto. 

Ele é ex-presidente da European Brain and Behavior Society. Rizzolatti foi o co-recebedor em 2007, com Leonardo Fogassi e Vittorio Gallese, do Prêmio Grawemeyer da Universidade de Louisville for Psychology. 

Um dos processos mais fascinantes da neurociência é constituído por neurônios espelho e empatia, com ele as ações e as emoções alheias não passam despercebidas e podemos ser capazes de dar uma resposta empática. São mecanismos que também têm um contexto social e sua implementação tem uma grande influência em nossas relações cotidianas. 

Nos imaginemos por um momento sentado nas cadeiras de um teatro, visualizemos agora um grupo de excelentes atores nos apresentando uma determinada obra, executando precisos movimentos corporais e gestuais e entoando cada palavra perfeitamente, conseguindo com isso nos contagiar com uma infinidade de emoções. 

Nada disso faria sentido se não tivéssemos essa base biológica capaz de nos permitir ativar uma poderosa gama de sensações, sentimentos e emoções, como o medo, a compaixão, a alegria, a preocupação, a repulsão, a felicidade. Sem tudo isso o próprio “teatro” da vida não teria qualquer significado, seríamos como entidades vazias, uma civilização de hominídeos que não poderia ter desenvolvido algum tipo de linguagem. 

Assim, não pode nos surpreender que o interesse pelos neurônios espelho e pela empatia não seja reduzido apenas ao mundo da neurociência ou da psicologia, também a antropologia, a pedagogia ou a arte têm se ocupado nas últimas décadas para conhecer um pouco mais dessa arquitetura interior, esses maravilhosos mecanismos sobre os quais ainda não sabemos tudo. 

Quando observamos uma pessoa realizando um ato de gentileza como, por exemplo, oferecer uma flor para alguém, imediatamente compreendemos essa atitude. Da mesma forma, se presenciamos um ato de agressividade, identificamos a expressão de raiva instantaneamente. Ao passo que no primeiro caso sentimos prazer e nosso comportamento é de aproximação, no segundo sentimos desprazer e nossa atitude é de aversão. 

Essa capacidade de empatia, ou seja, de reconhecimento da emoção alheia, é uma característica altamente adaptativa ligada à sobrevivência da espécie. Antigamente, pensava-se que essa capacidade de reconhecimento era decorrente de um processo puramente cognitivo, isto é, observaríamos a expressão facial e corporal do interlocutor e, dadas suas características, poderíamos deduzir de qual emoção se tratava através de um processo lógico. No entanto, hoje se sabe que essa compreensão ocorre devido à existência de um sistema neural específico denominado neurônios espelho. 

Não se trata de um processo dedutivo, mas da capacidade de compreensão imediata da experiência emocional do outro porque identificamos a mesma experiência em nós mesmos. Trata-se, portanto, de um processo de ressonância, compreendemos a ação do outro de modo automático como se ele fosse nós mesmos, o que nos remete à afirmação de filósofos como Merleau Ponty: “Nós compreendemos o outro porque temos dentro de nós a mesma experiência”. 

Esse sistema neuronal foi descoberto na década de 90 por uma equipe de neurocientistas italianos liderados por Giacomo Rizzolati. Nessa época, Rizzolati estava interessado na identificação dos neurônios motores envolvidos em um ato motor voluntário em macacos não condicionados, quando se deparou com um estranho resultado. Ele notou que as mesmas áreas motoras envolvidas no ato motor também disparavam quando o animal observava a mesma ação realizada pelo experimentador. 

Posteriormente, inúmeros experimentos demonstraram a existência de neurônios espelho em diferentes espécies, até mesmo em pássaros. No ser humano, foram identificadas áreas cerebrais específicas como o córtex insular, ligadas à identificação de emoções. Quando assistimos a um filme e nos emocionamos com determinadas cenas estamos ativando as mesmas áreas cerebrais que o ator está experenciando. 

Quanto maior a identificação da experiência em nós, maior a ativação neuronal. Um elegante experimento demostrou esse fato: através de ressonância magnética funcional, observou-se a atividade neuronal de uma bailarina clássica quando essa assistia uma apresentação de um bailarino clássico do sexo oposto. Nesse caso, as mesmas áreas cerebrais envolvidas para execução do movimento eram identificadas no cérebro da observadora. 

Além disso, quando a experiência era feita com uma bailarina que assistia a apresentação de outra dançarina clássica, ou seja, alguém do mesmo sexo, a atividade neuronal era ainda maior. Contudo, quando essa mesma bailarina observava um jogo de capoeira, cujos fundamentos não eram de seu conhecimento, seu cérebro mostrava pouca atividade. 

Atualmente esse sistema espelho está sendo amplamente estudado e observamos seu envolvimento em muitos processos importantes, como no aprendizado por imitação, no desenvolvimento da linguagem, assim como em diferentes patologias, entre elas o autismo. Por isso, nesse contexto, cabe a frase do brilhante neurocientista Ramachandram “A descoberta dos neurônios-espelho representa para os estudos da mente o que o DNA representou para a biologia”. 

Esse dado não é muito conhecido e é importante o recordarmos. A empatia não existiria sem o movimento, sem nossas ações, gestos, posturas. De fato, ao contrário do que podemos pensar, os neurônios espelho não são um tipo específico de neurônios, na verdade, eles são células do sistema de pirâmide relacionadas ao movimento. 

No entanto, eles têm a particularidade de serem ativados não só com o nosso movimento, mas também quando observamos o dos demais. Isso foi o que descobriu o Dr. Giacomo Rizzolatti. Os neurônios espelho nos permitem empatizar com aqueles que nos cercam, eles são a ponte que nos conecta, que nos vincula entre nós e que, por sua vez, nos permite experimentar três processos muito básicos: 

1 - Poder conhecer e compreender o que a pessoa que tenho em frente sente ou experimenta (componente cognitivo). 

2 - Também podemos “sentir” o que essa pessoa sente (componente emocional). 

3 - Finalmente, e esse tipo de resposta sem dúvida exige maior sofisticação e sensibilidade, podemos, por sua vez, responder de forma compassiva, dando forma a esse comportamento social que nos permite avançar em um grupo. 

Devemos, portanto, aprender a olhar para os outros deixando de lado os preconceitos. Também não serve que nos limitemos a “sentir o mesmo que os outros sentem”, é necessário que possamos compreender sua realidade, mas manter a nossa para poder participar efetivamente do processo de ajuda, de apoio, de altruísmo. 

Porque, afinal, o sentimento que não é acompanhado pela ação é inútil. Assim, se chegamos onde estamos, é precisamente porque fomos proativos, porque nos preocupamos com cada membro de nosso grupo social ao entender que juntos avançamos em melhores condições do que na solidão. Lembremos, portanto, qual é o verdadeiro propósito dos neurônios espelho e da empatia: promover nossa sociabilidade, nossa subsistência, nossa conexão com quem está ao nosso redor.