08 Apr
Observação, sentimento, necessidade e pedido

Existe diferença entre observar e interpretar um fato. O primeiro componente da CNV acarreta necessariamente separar observação de avaliação ou interpretação. Precisamos observar claramente, sem acrescentar nenhuma avaliação, o que vemos, ouvimos ou tocamos que afeta nossa sensação de bem-estar. Observar é o primeiro passo de uma forma importante e autêntica de expressar claramente a outra pessoa como estamos. Na observação, descrevemos o que é captado por nosso sentido com o máximo de riqueza possível evitando adicionar qualquer elemento que venha de uma opinião ou interpretação do que está sendo descrito.

Avaliação é o processo no qual fazemos essa interpretação do objeto descrito. E o perigo mora aí: quando misturo observação com avaliação, estou passando a minha forma de interpretar como se fosse um fato observado. Além de ser um elemento de forte manipulação, pode soar como crítica e, no lugar de se concentrar na mensagem que queremos passar, as pessoas vão se concentrar em se defender do que é dito. Avaliar alguém com essa linguagem estática é o que chamamos de rótulo: reduzimos a pessoa em seu processo de vida a uma única característica, imutável. Quase que uma condenação. O rótulo, também uma comunicação alienante da vida, desumaniza o outro mesmo que seja daqueles julgamentos como “neutro” ou “positivo". Se te rotulo como “cozinheiro”, por exemplo, te reduzo e me bloqueio para todo e qualquer comportamento que não esteja associado a minha definição dessa palavra. 

O processo de Comunicação não-violenta não nos pede para abandonarmos a avaliação, mas para que saibamos separá-la da observação, isso nos dá autonomia para escolhermos entre elas, mais consciência da nossa linguagem e menos alienação em nossas relações. Ele pede também para, ao escolhermos por avaliação, que optemos por uma avaliação processual, dinâmica, que leve em conta o momento e as especificidades de cada contexto. Em outras palavras, para que nossas avaliações não sejam estigmatizantes, generalistas e rotuladoras. 

 

ObservaçãoAvaliação
Até hoje, só vi João estudando na véspera das provasJoão vive deixando as coisas para depois (verbos de conotação avaliatória)
Acho que o trabalho dela não será aceito / Ela disse que o trabalho dela não será aceitoO trabalho dela não será aceito (implicar que minhas inferências são as únicas possíveis)
Ainda não vi aquela família estrangeira da outra rua limpar a casaOs estrangeiros não cuidam da própria casa (não ser específico a quem me refiro)
Em 20 partidas, Zequinha não marcou nenhum golZequinha é péssimo jogador de futebol (não ser específico no motivo da afirmação)
Não tenho atração física por MariaMaria é feia (usar adjetivos e advérbios como se fossem fatos)